Thursday, April 27, 2006

Luisão Pereira superstar

Outra sobre futebol: a Copa ganha espaço nas TVs da Europa (como no resto do mundo). E o Brasil tem espaço privilegiado, naturalmente. Esta semana, quem foi por mais de uma hora entrevistado na TV espanhola foi Luís Pereira, um dos melhores centrais que o Brasil produziu. E a Espanha tem boa lembrança dele, de quando jogou (e encantou) pelo Atlético de Madrid.
É particularmente lembrado o caldo que Luisão Pereira deu em Cruyff, à época o maior craque do futebol europeu. Só que Luisão era o maior craque das zagas espanholas. E num confronto entre Atlético e Barcelona, Luís Pereira anulou o extraordinário holandês. Com direito a desconcertante drible no maestro da Laranja Mecânica.
O estádio Vicente Calderón aplaudiu o brasileiro de pé. Por longos minutos.

Telê, futebol e música


Publicado no Diário do Povo, em 25 de abril de 2006

Hugo Picado é um costarriquenho que faz doutorado em Salamanca, Espanha. Sabe tudo de futebol, sobretudo do futebol brasileiro. Repete as escalações de 58 e 62 sem titubear. E tem especial devoção por Pelé e também pela seleção de 1982 - aquela que encantou o mundo com um futebol mágico e frustrou a todos com uma eliminação tão inesperada quanto injusta. Sexta-feira dei a notícia a Hugo: Telê Santana morreu. Tomou um susto como se fosse um amigo próximo.
A seleção de Telê jogada como uma orquestra. Telê fazia do futebol um concerto. E por isso Hugo tem tanto carinho por aquela equipe de Sócrates, Falcão, Zico e Júnior. Uma seleção que (como diz meu amigo de Costa Rica) só tinha duas fraquezas: o goleiro Waldir Perez e o dianteiro Serginho - este aliás, teve protagonismo no desastre espanhol pelo menos por dois gols perdidos de forma escandalosa. Apesar de Waldir Perez e Serginho, e apesar da desclassificação, aquela seleção mágica encantou e ficou na história das copas como algumas das grandes injustiças, junto à Hungria de 54 e à Holanda de 74.
É verdade, a orquestra vestida de amarelo desafinou contra a Itália (especialmente o tocador de Tuba, Serginho). Mas os concertos que ofereceu em outros jogos ainda ecoam. Graças à batuta de Mestre Telê e seus músicos extraordinários.
O futebol da seleção de 82 era o puro futebol brasileiro. O puro futebol de Telê, que construía equipes mágicas por onde passava. Está na história do futebol nacional o Atlético Mineiro dos anos 70, que Telê formou a partir de um bando de garotos, alguns lembrados até hoje pelo desconcertante talento. O maior de todos? Sem dúvida, Reinaldo, destruído em campo por becões que não tinham senão a truculência para enfrentar o brilho de seu toque. Aquela equipe de Telê revelou também Toninho Cerezo, Paulo Isidoro e outros.
Além de colocar em campo o legítimo futebol brasileiro, Telê tinha esse outro talento: revelar novos valores. Foi ele quem acreditou no Juninho, quem lustrou Raí e ajudou o São Paulo a parir uma constelação de estrelas que depois se espalharam pelo universo futebolístico europeu e de outros continentes. Com o São Paulo igualmente mágico que formou no início dos anos 90, Telê ganhou tudo. Campeonato paulista, brasileiro, libertadores e duas Taças Interclubes. Isto é, dois campeonatos mundiais.
Da primeira conquista mundial, contra o Barcelona, lembro até hoje da reação de Cruyff, o técnico do time espanhol, após a derrota: “Há um ditado holandês que diz: se você tiver que morrer atropelado, que seja por uma Ferrari” – disse o técnico, sem procurar desculpas, apenas reconhecendo que havia sido atropelado por aquela “Ferrari” do futebol. Quase se mostrava feliz por perder não para qualquer time, mas para o São Paulo de Telê.
Sem dúvida, é deliciosa a comparação de Cruyff com uma Ferrari, relembrando que aquele time era uma máquina azeitada e poderosa. Mas prefiro mesmo ficar com as lembranças do amigo costarriquenho, que via música na seleção de 1982. Assim eram as equipes de Telê, que fazia revelar até os talentos mais ocultos em cada jogador. E Telê encantava porque fazia brotar o mais puro estilo brasileiro, aquele desde sempre gravado na identidade dos nossos estádios, no coração do torcedor: não basta ganhar; é preciso encantar. Se não é assim, pense aí qual a equipe mais lembrada? A vitoriosa de 1994 ou a derrotada de 1982? Ganhamos em 94, mas estivemos longe de mostrar o talento brasileiro, salvo dois ou três jogadores. Era uma equipe travada, que não tinha brilho. Ganhou, mas tem um lugar menor na história como marca do futebol brasileiro.
A seleção de 1982 perdeu, mas encantou. Quase garante o carimbo de pé frio ao Mestre agora morto. Felizmente o tempo pôde recolocá-lo no devido lugar, com as conquistas do São Paulo. Telê mostrou que, mesmo em tempos de futebol de resultados, o talento tem espaço e o jogo bonito pode ser praticado. Mostrou que o futebol não pode ser comparado com uma engrenagem qualquer, repetitiva e previsível, mas com uma partitura que é executada com técnica e previsibilidade, sim, mas também com arte. Muita arte.
E por isso os concertos das orquestras de Telê seguem em nossas almas. E nos corações dos amantes do belo futebol, como o do costarriquenho Hugo.

Sunday, April 23, 2006

Dirceu, o amigo de fé

Em palestra em Salamanca (Espanha) paga pelo Centro de Estudos Brasileiros, o ex-deputado José Dirceu foi categórico: disse que continua conspirando, trabalhando dentro do PT e fazendo tudo o que Lula pede. Assim mesmo: tudo o que Lula pede. E isso inclui um bocado de conspiração dentro do espaço dos outros, como o PMDB de Itamar Franco. Pelo visto, Dirceu tem recebido muitos pedidos. E sendo recebido como intermediário do governo brasileiro inclusive no exterior, junto a representantes de outros governos.
Numa democracia mais amadurecida (especialmente quanto aos valores éticos), isso seria absolutamente impensável. Não custa lembrar, Dirceu foi cassado por uso e abuso da condição de ministro quase-dono-do-governo e indiscutível "dono" do PT, que naquele momento tinha Genoíno como um mero capataz. A simples palestra de Dirceu paga pelo Centro Brasileiro já causava espanto entre espanhóis. "Mas esse não é aquele cassado por corrupção?", indagavam, perplexos.
Agora, de volta à condição de articulador do governo, causa mais espanto ainda.
Mas as surpresas da campanha não terminam aí. Sim, porque Duda Mendonça continua sendo a voz mais ouvida quanto às estratégias de marketing. Quer dizer: a campanha de Lula de 2006 será igual à de 2002. Esperemos só que um possível segundo governo seja diferente do primeiro.

Lucro 'made in' Brasil

Pelo nono ano seguido, a Ford consegue lucro na América Latina. E tudo graças ao Brasil (http://www.estado.com.br/editorias/2006/04/22/eco98298.xml). Um aumento de 74% sobre o ano anterior. No desempenho mundial, a marca americana teve prejuízos. Esse fenômeno não é só da Ford: as montadoras fazem a festa no Brasil.
A FIAT só não foi à bancarrota nos últimos cinco anos por conta do Brasil. Ela é uma empresa que depende de Betim e Turim - e na tália andava muito mal das pernas, só agora se recuperando. A GM não depende do Brasil, assim como a VW. Mas as contas da GM ficam menos vermelhas por conta do lucro verde-amarelo, assim como os resultados brasileiros ajudam a tornar mais reluzentes os ganhos da alemã.
O Brasil oferece margens de lucro como nenhum outro país, além de juros estratosféricos que levam a montadores a ter bom suporte na operações dos seus bancos. Ganham aqui como em nenhum outro lugar. O mais curioso (ou resultado disso tudo): os carros produzidos aqui são mais caros que em qualquer outra parte. Um exemplo: um C3 com ar e tudo mais custa na Europa em torno de 24 mil Reais. No Brasil ronda os 40 mil. Pode?
Durma-se com um barulho desses.

Saturday, April 22, 2006

Telê: Futebol com música

Hugo Picado é um costarriquenho que faz doutorado em Salamanca, Espanha. Sabe tudo de futebol, sobretudo do futebol brasileiro. Repete as escalações de 58 e 62 sem titubear. E tem especial devoção por Pelé e também pela seleção de 1982 - aquela que encantou o mundo com um futebol mágico e frustrou a todos com uma eliminação tão inesperada quanto injusta. Ontem dei a notícia a Hugo: Telê Santana morreu. Tomou um susto como se fosse um amigo próximo. A seleção de Telê jogada como uma orquestra. Telê fazia do futebol um concerto. E por isso Hugo tem tanto carinho por aquela equipe de Sócrates, Falcão, Zico e Júnior. Uma seleção que (como diz meu amigo de Costa Rica) só tinha duas fraquezas: o goleiro Waldir Perez e o dianteiro Serginho. É verdade, a orquestra desafinou contra a Itália. Mas os concertos que ofereceu em outros jogos ainda ecoam. Graças à batuta de Mestre Telê e seus músicos extraordinários.

Wednesday, April 19, 2006

Um projeto para o Piauí

Publicado no Diário do Povo, dia 16 de abril de 2006

O Piauí se ressente de um projeto que o leve a alguma parte.
A frase não é nova. Tampouco está desatualizada. Os governos que se sucedem não conseguem levar a cabo um plano de ação que gere uma trilha de fortalecimento econômico e social capaz de seguir em frente independente do humor (e interesses) do governo seguinte; um caminho que faça o Estado andar sozinho.
Se olhamos para a evolução econômica do Piauí, veremos que o PIB sempre está associado a fatores como o desempenho da economia nacional ou as bênçãos de São Pedro: no ano que o inverno é bom, o Piauí colhe bons frutos; quando não, o PIB reclama fôlego. Fora isso, o Estado tem se apegado fundamentalmente ao desempenho de Teresina – a grande locomotiva, por fortuna com um rumo administrativo – e dos cerrados, que cresceram por iniciativa individual dos produtores e de alguns raros prefeitos conscientes da importância da produção de grãos no sul piauiense.
Fora isso, não há um rumo que se destaque como um projeto de desenvolvimento do Estado – e quando falo de desenvolvimento, não dissocio o econômico do social; são irmãos siameses: sem um o outro não tem sentido.
Potencial o Piauí tem muito, ainda que não se possa desconsiderar a necessidade de grandes investimentos em infra-estrutura, e isso é um problema inclusive para o mais preparado e melhor intencionado dos governantes. Mas o problema maior parece ter sido a falta da boa intenção, o pelo menos da boa visão do que pode vir a ser essa terra Filha do Sol do Equador. Não vou sequer falar da fruticultura, do turismo ou da agroindústria que muito bem pode dar ares novos a regiões interioranas, entre elas o sempre castigado semi-árido. Fiquemos com o caso de Teresina, onde (além do comércio) dois campos de atividades são especialmente poderosos, ambos na área de serviços: a saúde e a educação.
A saúde é uma das fortalezas da cidade, atraindo pacientes de outros estados (pacientes que às vezes sugam nossos recursos, mas que sobretudo geram muitas oportunidades e fazem de nossa cidade um dos três pólos nordestinos). Esse cluster cresceu nos últimos anos especialmente pela ação dos governos municipais e do apoio do Banco Nordeste. É amplo o reconhecimento da capacidade do setor médico-hospitalar de nossa cidade.
E esse mesmo setor ajuda a fortalecer a outra pilastra dessa diretriz de desenvolvimento de Teresina, a educação. Basta notar que hoje a cidade conta com três cursos de Medicina (UFPI, Uespi e Novafapi), enquanto Fortaleza tem dois. Isto não é por acaso.
Teresina conta com excelentes hospitais públicos e privados, com elevada capacidade de resolutividade em áreas tão diversas como câncer, queimados, doenças tropicais, em níveis acima de cidades bem maiores. Teresina conta também com excelentes cursos superiores, em instituições públicas e privadas. Na área de saúde, investimentos associados foram sendo estimulados, como os hotéis situados na região de concentração dos hospitais; ou os edifícios de escritório voltados para consultórios e clínicas.
Falta mais na área educacional. Por exemplo, estímulo à construção de pequenos apartamentos que abriguem os estudantes que chegam de outros estados; ou fortalecimento de um pólo gerador e (sobretudo) disseminador de novos conhecimentos (isto é, tecnologia) que produzam amplos benefícios à comunidade. Porque não pensar em Teresina como uma Campinas nordestina?
Quando tomo estes dois setores e o êxito relativo das ações no âmbito de Teresina é para reafirmar a necessidade de um plano amplo que se aproprie dos potenciais piauiense de forma geral e integrada, capaz de reproduzir o fenômeno teresinense em outras regiões do Estado. Inclusive porque não é mais admissível pensar um Estado que esteja focado num projeto tão centralizado, tão de costas para o interior.
Será inclusive muito positivo para Teresina que o Piauí tenha outros pólos econômicos fortes, capazes de oferecer a perspectiva de uma vida mais digna para quem vive fora da capital. Nesse – como em outros – campos o Piauí bem poderia olhar para o modelo de outros estados. Não vou nem me referir a São Paulo, com seus muitos pólos autônomos, uns focados na agricultura, outros na indústria, outros na produção de conhecimento ou na oferta de lazer. Bem podemos olhar para o Paraná, Santa Catarina, ou mesmo Paraíba e o Ceará da era tassista. Em cada um deles, buscou-se quebrar o absurdo desequilíbrio interno com a descentralização do desenvolvimento – que fortaleceu o interior e deu fôlego à capital.
Esse é um bom caminho para o Piauí. Mas um caminho que tem como primeiro passo uma idéia concreta dos muitos potenciais que o Estado tem, daí resultando em ações integradas que podem levar a bom porto.