Monday, December 19, 2005

O desafio do cocaleiro

Enfim a Bolívia colocou um representante indígena no comando desse país com dois terços da população formadas por indígenas. Mas certamente a tarefa de Evo Morales não será fácil. Aliás, ele foi eleito muito por conta disso: a Bolívia é um país miserável, com quase todo mundo na pobreza, gerando o descontentamento generalizado com as elites tradicionais. Daí o voto na alternativa diferente, talvez a última, vinda do povo. Morales chega ao poder cercado de muitas (muitíssimas) esperanças. E não poderá corresponder com facilidade. A primeira delas é dar uma vida melhor ao povo da "banda alta" (oeste da Bolívia) formado, sobretudo, por indígenas que por anos e anos viveram da coca. Com a ajuda dos Estados Unidos, as plantações de coca foram drasticamente reduzidas. Mas essa gente não ganhou outro modo de vida. E a miséria que já era grande ficou ainda maior. Tem mais: a Bolívia repete o cenário da maior parte dos demais países latino-americanos - um potencial enorme (sobretudo pelos recursos naturais) e uma realidade insultante. Morales chega ao poder quase sem compromisso com as elites tradicionais. Isto é bom e ruim. Bom porque quase não tem compromissos a priori, o que abre a perspectiva para mudanças profundas. Ruim porque, sem apoio de atores fundamentais, nenhum governo consegue ser estável. Mas o melhor de tudo é que, entre essas duas faces da moeda, Morales tem margem para negociar, fazer concessões e, mesmo assim, implementar um programa de transformações fundamentais para o povo do país.

Sunday, December 18, 2005

O brinquedo de George

Dentro dos Estados Unidos, as análises se dividem: um pouco mais da metade diz que a política externa de W.Bush é um desastre. Um pouco menos da metade diz que é acertada, festejando ações como a Guerra do Iraque. Fora da terra do Tio Sam, o equilíbrio de desfaz. A grande (grande mesmo!) maioria vê na política de Bush um desastre geral: desastre para os Estados Unidos, fragilizados na sua condição de líder, com ônus imediatos e sobretudo a longo prazo; e desastre para o resto do mundo, que engole sem mastigar as decisões da grande economia do planeta. Essa visão é bem traduzida por Ventura, chargista do jornal La Vanguardia, de Barcelona. Na bem humorada visão sobre o "desastre bushiano", o mundo é um brinquedinho para o senhor texano. Ou, pior para nós, um bem castigado saco de pancadas.

Wednesday, December 14, 2005

Os a favor e os contra Lula

A mais nova pesquisa Ibope sobre as intenções de voto para presidente mostra que a situação do presidente Lula é delicada. Em qualquer dos cenários simulados, ele tem um limite muito claro. Traduzindo: há um bloco muito sólido de gente que não vota nele. Pelo menos hoje. Senão vejamos os números que colhi mastigados no Blog do Noblat:

CENÁRIO 1
Lula - 31% (eram 33% em setembro último)
Serra - 37% (eram 30%)
Garotinho - 11% (eram 10%)
Heloísa Helena - 4% (eram 5%)

CENÁRIO 2
Lula - 32%
Alckmin - 20%
Garotinho - 20%
Heloísa - 7%

CENÁRIO 3
Lula - 33%
Aécio - 11%
Garotinho - 22%
Heloísa - 9%

Em nenhuma das simulaçoes Lula passa de 33%. Varia de 31 a 33. Isso quer dizer que um percentual grande está na oposiçao, contra ele, contra o governo: se sai o Serra, o voto não vai para Lula e sim para Garotinho; se sai Alckmin, Garotinho cresce mais ainda. Claro ainda há um número razoável de indecisivos (que varia conforme simulação), mas o certo é que os limites de Lula devem estar tirando o sono do presidente. Sim, há cerca de um terço do eleitorado a favor de Lula. Mas numa disputa em dois turnos, é um número baixo. Sobretudo porque no segundo turno (as simulações mostram), hoje, Lula tiraria muito pouco dos candidatos que ficam fora do páreo. Além disso, a crise de corrupção colou no governo e o presidente vê todos seus índices diminuindo a cada nova pesquisa. É esperar a próxima para conferir...

Saturday, December 10, 2005

A riqueza do Brasil

O Brasil, sempre apontado como a 12ª economia do planeta, acaba de cair para a 31ª posição. A mudança é resultado de uma nova metodologia adotada pelo Banco Mundial que leva em conta não apenas o PIB. Toma em consideração uma série de fatores, incluindo a distribuição de renda (que dá uma medida de justiça social, quesito onde o Brasil anda péssimo desde sempre) e o "capital social". Capital social quer dizer qualificação da população (nível educacional, capacidade de cooperação etc, outro quesito onde o Brasil vai péssimo). Pela nova metodologia, Estados Unidos saem da primeira posição para a quarta.
O critério parece dizer mais claramente da realidade do povo de um país. Veja-se o comparativo com a Espanha: o PIB espanhol é pouco maior que o do Brasil. Mas enquanto a Espanha tem 43 milhões de habitantes, o Brasil tem 180. Ou seja, um bolo quase do mesmo tamanho para uma população mais que quatro vezes maior. Além disso, na Espanha quase todo mundo tem um curso superior, realidade ainda muito distante no Brasil. Mesmo na América do Sul estamos na 4ª posição. Não é prá menos: basta lembrar que argentinos e uruguaios têm uma média de 9 e 8 anos de ensino, contra 5 anos de média para os brasileiros.
A nova metodologia do Banco Mundial acaba, por exemplo, com aquela falsa euforia da década de 80 quando éramos festejados como a 8ª economia do planeta. Sim, em termos brutos, estávamos entre os oito. Em termos relativos, a realidade sempre foi muito diferente, muito mais dura.
A propósito, pela nova avaliação, o país mais rico é a Suiça. O que está muito de acordo com a qualidade de vida da população.

Os favoritos da Copa

Ainda sobre a Copa: quem são os favoritos? O Brasil está entre eles, claro. Tem tradição, tem craques, muitos craques. Não me encanta o treinador excecivamente conservador (de um futebol que às vezes não honra a categoriade nossos craques). Mas estamos no páreo, com certeza. Inclusive porque já ganhamos um título com o mesmo treinador, e jogando um futebol nada brilhante.
Das outras seleções, quem assusta? Bom, assustar não deve ser o termo, mas devemos ter atenção a algumas em especial. Alemanha, naturalmente: mesmo jogando mal (como em 2002) é um time de chegada; jogando em casa, é um perigo maior. Inglaterra: tem um time compacto, um eficiente jogo coletivo e excelentes jogadores (Owen, Lampard, Beckhan etc). A República Tcheca tem jogado muito bem, unindo talento e disciplina tática. Portugal tem um bom grupo e um técnico que sabe o que é ganhar uma copa. Itália e França têm bons jogadores e camisa. E, maior de todos os perigos, a Argentina: tem tradição, garra e craques, muitos craques. Sorin, Pablo Aymar, o excepcional Riquelme e um garoto que apesar de seus 18 anos joga coisa de gente (muito) grande. O nome dele? Messi. O menino do Barcelona encanta a todos que o vêem. Pode ser a grande revelação da Copa.
Aqui prá nós, tomara que não. Queremos mais um caneco, claro.

O Brasil na Copa: dureza

Já que é o assunto do dia, vai lá: o Brasil pergou um grupo bastante razoável na Copa. Mas não a porteira aberta anunciada por alguns. Japão e Croácia são times bem estruturados, especialmente a Croácia, ainda que nada excepcionais - e que podem se converter em seleções "enjoadas", que até perdem, mas sem deixar de aporrinhar. Austrália, em tese, é uma baba. O Brasil deve passar sem problemas a primeira fase. Mas as facilidades terminam aí. Na segunda etapa, a Canarinho pega alguma seleção daquele que para mim é o mais equilibrado dos grupos: o "E", com Itália, República Tcheca, USA e Gana. Da Iatália não precisamos falar. Os tchecos jogam muito bem há uns quatro anos (apresentaram o mais sólido futebol da EuroCopa 2004), USA vêm surpreendendo pela firmeza coletiva e categoria individual de alguns jogadores) e Gana joga bonito há uns 15 anos, ainda que falte cancha, experiência. Mas se quisermos ser campeões, não importa quem venha. temos que ganhar. E depois de uma primeira fase de consolidação, que apareça a Itália ou quem seja.

CHORO ARGENTINO - Todo mundo diz que a Argentina está no Grupo da Morte. Ora, é um grupo que (em tese) tem dois nomes certos para a segunda fase: Holanda e Argentina. Se os "hermanos" temem a Sérvia, paciência!, aí não podem pensar em título. Além disso, a Holanda tem a tradição de jogar bonito antes... e nada na copa (exceção para 74 e 78, claro).

Thursday, December 01, 2005

Zé Dirceu, como todo morto, virou gente boa

O PT e o governo se esconderam durante toda a agonia de José Dirceu. E deixou que se enforcasse na votação de ontem. Como bem disse Luciana Genro, era conveniente ter um bode expiatório. Agora que o Zé foi prás cucuias, todo o PT se lamenta. O governo também. O presidente Lula, de repente, colocou a cara no caso e disse que foi uma injustiça. As lideranças do partido no ongresso fizeram o mesmo. E as lideranças regionais - como João de Deus, no Piauí - repetiram o bordão: foi uma injustiça.
PT e governo querem reforçar a imagem de vítima. E, de quebra, tirar uma casquinha; levar parte dessa condição de vítima, posição que o governo tem abraçado sempre e sempre, pelo menos nos últimos quatro meses, após uns três meses de arrogante silêncio sobre a crise, como não tivesse nada com o Planalto e o partido. A aposta na posição de vítima é tanta que Lula chegou a recorrer a casos históricos de injustiça, como a condenação pública indevida de Alcenir Guerra. Esqueceu só de dizer que o PT capitaneou as vozes de crucificação pública do "pobre injustiçado" do Alcenir.
Mortinho da Silva, agora Zé Dirceu é um bom discurso para o PT e o governo. Exatamente ele, que vivinho e já recheado de denúncias arrepiantes, foi deixado pelo governo e pelo PT na cova dos leões. Mas o raciocínio ultra-pragmático é um só: defender o pobre do defunto, porque o brasileiro não costuma cuspir em cadáver. Então, já que ele está morto, Viva o Zé!!!